Wednesday, August 31, 2005

de mansinho

- Qual é mesmo o endereço do seu blog? Tormentas? Tempestades? Terremotos? Tsunâmis?
- Transbordamentos, querido, transbordamentos...

( eu não sou uma mulher assim, tão intempestiva, lembra? Se algum dia eu for causar qualquer tipo de inundação, vai ser de mansinho, mansinho...)

( e hoje essa enxurada de posts, apesar de toda a tendência à mansidão...)

mais Drummond

Ausência

Por muito tempo achei que a ausência é falta.
E lastimava, ignorante, a falta.
Hoje não a lastimo.
Não há falta na ausência.
A ausência é um estar em mim.
E sinto-a, branca, tão pegada, aconchegada nos meus braços,
que rio e danço e invento exclamações alegres,
porque a ausência, essa ausência assimilada,
ninguém a rouba mais de mim.

(esse chegou de presente... eu, nesta fase tão Clarice, ando achando Drummond meio um carinho, meio um soco no estômago... )

Janela sobre o Adeus

Não conseguia dormir. Ele havia guardado todos os sonhos juntos, numa sacola de supermercado, e a sacola tinha se aberto e os sonhos tinham escapado, e ele não conseguia mais dormir porque não tinha nenhum sonho para sonhar.
É o que dizia. E dizia também que tinha perdido dois dias, uma segunda e uma terça, e que os procurava, desesperado, e não achava aqueles dias em lugar nenhum.
Não foi breve, a agonia. Tinha cada vez menos ar. No final, crucificado pelas sondas, só conseguiu balbuciar:
- Que ladeira comprida!
E morreu, sem encontrar os sonhos e os dias que havia tido e tinham ido embora.

- Eduardo Galeano -


("Desnecessário" dizer que foram perdidos tão, tão mais que dois dias...
e que sonhos não se guardam, muito menos todos juntos, e que mesmo quando eles escapam ( porque esta é a natureza dos sonhos!), tem um monte de outros sonhos pra sonhar - outros sonhos, que fique claro.)

Entrelinhas

Mas já que se há de escrever, que ao menos
não se esmaguem com palavras as entrelinhas.

- Clarice Lispector -

Eu queria saber ser menos literal - colocar um texto aqui e pronto. E deixar mais solto, com mais frestas, enfim, a cargo de cada um criar a sua própria interpretação - e me expor menos, também. Mas não consigo - aliás, nem sei se quero. Sei lá se é síndrome de professora, essa necessidade de ir explicando tudo (ou de tirar lições de tudo, o que pode ser ainda mais nocivo...) mas o fato é que, conforme eu leio ou vivo algo, já vai se encadeando um pensamento todo cheio de parênteses, ganchos e desdobramentos...
Se antes esses devaneios se contentavam em vagar meio sem rumo - no máximo ancorar em páginas de caderno ou em E-mails para amigos mais sensíveis, agora esses pensamentos parece que sabem que podem aportar por aqui, então, ao invés de se dissiparem no ar, eles vão se arrobustando, criando vida quase própria e exigindo um pedacinho de chão para fincar raízes...
Enfim - não vou lutar com isso (a gente já tem que lutar com tanta coisa, o tempo todo, sempre!) - e portanto ficam os textos e aquelas ressonâncias mais teimosas...


E eu simplesmente confio que quem visita esse meu jardim gosta de mim o suficiente pra perdoar arroubos mais espontâneos e esse meu jeito de ir emendando um assunto no outro, comendo uma letra ou uma palavra aqui, outra ali, abrindo parênteses dentro de parênteses, enchendo tudo de reticências...

Tuesday, August 30, 2005

Pertença ambulante

O que eu queria, e não posso, é por exemplo que tudo o que me viesse de bom de dentro de mim eu pudesse dar àquilo que eu pertenço. Mesmo minhas alegrias, como são solitárias às vezes. E uma alegria solitária pode se tornar patética. É como ficar com um presente todo embrulhado em papel enfeitado de presente nas mãos - e não ter a quem dizer: tome, é seu, abra-o! Não querendo me ver em situações patéticas e, por uma espécie de contenção, evitando o tom de tragédia, raramente embrulho com papel de presente os meus sentimentos. (...)

Pertencer não vem apenas de ser fraca e precisar unir-se a algo ou a alguém mais forte. Muitas vezes a vontade intensa de pertencer vem em mim de minha própria força - eu quero pertencer para que minha força não seja inútil e fortifique uma pessoa ou uma coisa.

(Clarice Lispector in "A Descoberta do Mundo")

O desejo de pertença é quase intrinseco a "ser" - a diferença talvez seja que alguns se sentem mais pertencidas, e outros, sei lá, são mais "côncavos" mesmo...
E, segundo a Antropologia do Imaginário, esse desejo de pertença está muito ligado à terra-mãe - Pachamama.
Como pode, então, esse meu "querer pertencer" ter tão mais asas que raízes???
Vai ver que que a teoria do Suassuna sobre os dois tipos de preguiça: uma com rabo e outra com asas, também se aplica ao desejo de pertença...
Aliás, no fundo no fundo, essa teoria se aplica a quase qualquer coisa...

Monday, August 29, 2005

encontro singelo

Sabadão, almoço delícia no indiano e "Encontros e Reencontros na Arte Naif - Brasil - Haiti".
Tão bom esses encontros que ressoam dentro da gente...

Ficam aqui algumas das imagens, prá trazer um pouquinho deste encontro encantado e incentivar visitas...







(em tempo, a exposição está na Faap e acaba neste domingo, 04/set)

13 anos depois...

Alegria, alegria:
finalmente meu corpo volta a produzir TSH... tudo bem que o nível ainda beira o rídiculo e precisou rolar um tratamento com radiação (e tudo o que isso implica) para me livrar dos nódulos mil que eu tinha na tireoide, mas... parece que meu organismo resolveu reagir direitinho!

Então o quadro é o seguinte: mortos ( ou agonizantes) os nódulos, começa a faltar T3 e T4. A hipófise percebe e depois de 13 anos volta a produzir TSH - que no fim do dia dá umas chicoteadas na tireoide pra ela deixar de ser preguiçosa e produzir hormônios decentemente.
Estamos nesta fase - eu e minha tireoide ainda nos ajustando a este novo contexto.
Então eu ando toda em marcha lenta, sentindo sono, até, olha só que inédito!
Rola também uma certa da neurose - afinal metabolismo mais baixo costuma resultar em quilos querendo aportar - mas beleza, nada que eu não tenha enfrentado antes, nada que eu não saiba como lidar...
Resumo da ópera: Estou contente!
E já começo a agendar minha próxima ida à praia para presentear minha tireoide com uma overdose de Iodo!!

(Hahahaha! Aposto que tem gente que, vendo o título deste post já imaginou a volta do muro das lamentações...)

Sunday, August 28, 2005

Drummond explica

Não, meu coração não é maior que o mundo.
É muito menor.
Nele não cabem nem as minhas dores.
Por isso gosto tanto de me contar.
Por isso me dispo, por isso me grito,
por isso frequento jornais, me exponho cruamente nas livrarias:
preciso de todos.

Thursday, August 25, 2005

Apego -II

Microconto
- Amor, cê viu o ontem que eu pendurei ali no cabide?
- Guardei na gaveta de cima, debaixo do amanhã.
- Fez bem. Esse negócio de ontem jogado pela casa é muito
perigoso pro nosso hoje, tão novinho.
André Gonçalves

(prá variar, textos me caem como uma luva!!)

Wednesday, August 24, 2005

Apego

Trago dentro do meu coração,
Como num cofre que se não pode fechar de cheio,
Todos os lugares onde estive,
Todos os portos a que cheguei,
Todas as paisagens que vi
através de janelas ou vigias,

Ou de tombadilhos, sonhando,
E tudo isso, que é tanto,
é pouco para o que eu quero.
- Álvaro de Campos -


Esta imagem ( um bordado da Violeta Parra, lindo, lindo) e este poema, para mim, são a própria materialização do apego à memória.
Eu gosto de acreditar que meu apego pelas coisas é pequeno.
Por outro lado, sei muito do meu apego às pessoas, mesmo quando elas não sabem... e, mesmo esse meu pouco apego pelas coisas, é sempre apego pelas pessoas ou por momentos, disfarçado.
Quando roubaram meu carro, por exemplo (e já roubaram dois!!) não fiquei triste pelo(s) carro(s), mas por um lenço que meu irmão tinha pintado, por um caderno cheio de começos de pensamentos, por umas fotos de Jacaré dos Homens, por uma lagosta de pelúcia comprada num passeio com pessoas queridas em Boston...
Tenho que admitir - e é com um pouco de vergonha que admito isso! - que ando meio apegada a estes transbordamentos. Vai me dando uma pena de ver alguns escritos ficando lá prá baixo, escondidos... Talvez tenha um pouco a ver com esse meu jeito de querer carregar tudo em paralelo, não deixar nada prá trás (mesmo que muitas vezes tenha passado da hora de "let it go").
Os posts com fotos, por exemplo - melhores momentos de Julho, gnocchi em casa, meu aniversário, eu pequenininha... os textos mais queridos ( o canto para uma semente!!!), até a linha do tempo - que seria tão diferente agora, mas que ainda assim é tão retrato de mim... e mesmo alguns posts mais cheios de mágoa-com-pseudo-amigo-que-me-fez-tão-de-palhaça lá do comecinho- mas aí talvez seja menos apego e mais "instinto de auto-preservação" - não para cultivar rancores, mas para evitar cair em roubadas parecidas (ou para voltar a ter coragem de me deixar levar em outras roubadas deliciosas...)- enfim, toda essa arqueologia de mim...
O fato é que eu queria ser menos apegada às minhas próprias memórias... Mas esse exercício de "desapego" não é dos mais fácéis... até porque rola em paralelo um movimento contrário: uma vontade de tomar de volta - me re- apropriar - de coisas/lugares/poemas que dividi/dei de presente - aí, até sem mágoa, mas querendo muito ter preservado mais o que me era tão caro... (Como os meus sacis!!!)
O engraçado é que re-apropriar-me das coisas aqui se traduz em dividir com quem estiver passando...vai entender!

E o não querer que as coisas fiquem escondidas lá prá baixo deve ser reflexo desta vontade de manter este espaço mais como Mural de Cortiça e menos como cofre, de não "perder a coisa à vista"...

"Guardar...guardar...guardar
Guardar uma coisa não é escondê-la ou trancá-la
Em cofre não se guarda nada
Em cofre perde-se a coisa à vista
Guardar uma coisa é olhá-la, fitá-la
Mirá-la por admirá-la
Isto é, iluminá-la ou ser por ela iluminado
Estar acordado por ela
Estar por ela
Ou ser por ela."
- Antônio Cícero -

E, conforme vou criando esse "rastro de memórias", fico feliz, feliz por perceber tomando corpo, também, um rastro de amigos queridos - que insistem em ficar por perto mesmo quando eu me escondo, que eu insito em manter perto mesmo quando se afastam, que são um pouco anjo da guarda, que me "guardam" tanto...
Acho que no fundo, essa constelação de gente querida é um pouco a materialização desses apegos todos também. E isso é bom, muito bom.

Delitos e decretos

Vivo como se fosse um país com decretos secretos.
E, por não conhecer estes decretos, cometo delitos e
vou preso sem saber por quê.

(Paulo Gaudêncio)

--> Com 2 agravantes:
1) não dá prá alegar desconhecimento da lei e,
2) sem saber esses "decretos", não dá para aproveitar aquele gostinho de estar quebrando as regras, de goiaba roubada no pé... (que, sejamos sinceros, às vezes é o que justificaria/ compensaria os delitos e a prisão...)

Tuesday, August 23, 2005

"undo"

Não há dúvida que a vida seria bem mais tranquilinha se tivesse um jeito de dar "undo" de vez em quando... mesmo que fosse para, no segundo seguinte, dar um "re-do", aliviada por ter feito a escolha mais certa...
Sem descanso, busco outras alternativas - "Ctrl+z" e afins - sem sucesso...
Por outro lado, mesmo que houvesse um "undo" ... pra conseguir efetivamente corrigir algo, seria necessário tomar esta decisão rapidamente... como fazer para "undo", hipoteticamente, algo feito em Março se o tamanho da burrada só fosse percebido, vamos dizer, em Junho? Muito provavelmente, a sequência de "undos" chegaria no limite antes que se chegasse à raiz da questão....
Uma luz: quem sabe um "cut" sem "paste" em lugar nenhum?
E, mas... não é o mesmo efeito do "undo" - sei lá, fica tudo um pouco mexido, fica lá aquele espaço em branco, de onde nitidamente algo foi arrancado...
Ainda assim, me parece uma alternativa interessante... mas... ao tentar seguir adiante, sou avisada de que ficou muita coisa na área de transferencia, perguntando se eu quero salvar para usar em outros aplicativos...

Que insistência certas coisas têm em permanecer na área de tranferência!!!
Mas não pretendo, de forma alguma, deixar coisas que não podem ser desfeitas continuarem ocupando esse espaço todo na memória...

E a pergunta que não cala nunca:

A mulher que diz tchau

Levo comigo um maço vazio e amassado de Republicana e uma revista velha que ficou por aqui. Levo comigo as duas últimas passagens de trem. Levo comigo um guardanapo de papel com minha cara que você desenhou, da minha boca sai um balaozinho com palavras, as palavras dizem coisas engraçadas. Também levo comigo uma folha de acácia recolhida na rua, uma outra noite, quando caminhávamos separados na multidão. E outra folha, petrificada, branca, com um furinho como uma janela, e a janela estava fechada pela água e eu soprei e vi você e foi o dia em que a sorte começou.

Levo comigo o gosto do vinho na boca. (Por todas as coisas boas, dizíamos, todas as coisas cada vez melhores que nos vão acontecer.)


Não levo nem uma única gota de veneno. Levo os beijos de quando você partia (eu não estava dormindo, nunca). E um assombro por tudo isso que nenhuma carta, nenhuma explicação, podem dizer a ninguém o que foi.


- Eduardo Galeano in Vagamundo -

Thursday, August 18, 2005

Receita de não sofrer

"...Existem duas maneiras de não sofrer. A primeira é fácil para a maioria das pessoas: aceitar o inferno e tornar-se parte deste até o ponto de deixar de percebê-lo. A segunda é arriscada e exige atenção e aprendizagem contínuas. Tentar saber reconhecer quem e o que, no meio do inferno, não é inferno, e preservá-lo, e abrir espaço."

As Cidades Invisíveis, Ítalo Calvino

Aprantei pra nascer semente...

Já que falei na aula de canto, achei que cabia aqui ( faltava aqui?) essa "Cantiga d´Água"...
Só mesmo a Mestra Virginia para descrever o ciclo da água de forma tão singela e poética... E a Sandra Ximenes, para cantar tão lindamente... vale a pena uma visitinha lá no site do Axial para ouvir...

(E já que a cantiga veio de Alagoas, achei que merecia vir pra cá também esta foto das meninas do Caititu, Jacaré dos Homens, que eu "flagrei" dançando, lindamente, tão espontaneamente, nas minhas andanças por lá...)
Cantigas d´Água

Determinei subir no vento
Eu fui ao país da Lua
Arrecebi uma friagem tua
Eu vi a terra diferente

Um corisco ia
passando de repente
Com o corisco eu me abracei
Desci pra terra eu aprantei
Aprantei pra nascer semente

O arco-íris bebe água lá no mar
Quando ele quer despejar
Ela por cima da terra

A nuvem gela faz
sua circulação
Quando ela cair no chão
A gente apanha e bebe ela.

Nessas horas me dá uma vontade de ainda ser professora de Ciências...

(Corisco é um outro nome para raio, relâmpago...
Será que vem daí o Corisco do bando de lampião?)

Tuesday, August 16, 2005

Aula de Canto - Aprendizagens

Pra cantar, fundamental é pensar nos espaços internos, deixar a voz e o ar passear pelo corpo e inundar dentro e fora.
É preciso respirar nos intervalinhos, conforme a música deixa.
Surpresa: me percebo com mais fôlego que imaginava!
Chega a hora de respirar e eu cheia de ar lá dentro...
Tento, então, me programar para deixar o ar sair na velocidade correta, no tempo correto - para então expandir as cavidades internas e deixar o ar entrar.
Funciona algumas vezes, mas , daqui a pouco, lá estou eu, ficando sem ar por estar cheia de ar...
Esse aprender a respirar mais curtinho, deixar entrar só o ar suficiente para alguns versos e deixar ele sair todo, sem medo de ficar vazia um pouquinho não tem sido muito fácil... sei lá, é um pouco "contra-intuitivo"... parece que eu estou sempre me preparando para um mergulho...

Diz quantos desastres tem na minha mão...


Estou com saudades de mim.
Ando pouco recolhida, atendo demais o telefone,
escrevo depressa, vivo depressa.
Onde está "eu"?
Preciso fazer um roteiro espiritual
e encontrar-me – enfim, mas que medo -
de mim mesmo.

- Clarice Lispector -

(ou não: fugir, correndo, loucamente, de mim!
Quem sabe assim eu paro de repetir as mesmas estórias???)

Sunday, August 14, 2005

Dia dos Pais


Sem muitos preâmbulos, fica aqui essa cartinha, linda, inesperada, linda do meu pai, sempre "tão desajeitado em entregar sua ternura"...
(Essa é uma expressão que o Thiago de Mello usou, falando de seu pai. O engraçado é que, eu também ando me percebendo meio desajeitada para entregar minha ternura...)


Oi, Juju

Tive 3 filhos queridos, muito diferentes entre si.
Você é a mais criativa, consegue perceber detalhes tão fundamentais ao mesmo tempo imperceptíveis, que as vezes demoramos para entender.
Essa mesma característica maravilhosa que deve ser cultivada e protegida faz muitas vezes você retrair-se diante da agressividade de nossa impercepção.
Depois que entendi isso comecei a saber dar corda para você se soltar, aprofundar e pude aprender com o brilho de sua mente.
Você é sempre muito importante para mim.



Maezinha - fica com ciúmes, não.
É que seu afeto sempre foi mais escancarado, então acaba não precisando dessas evidências mais tangíveis...

Friday, August 12, 2005

Perda de inocencia

Eu sempre soube que algodão e nuvens
não tinham relação nenhuma
e que a lua nunca foi feita de queijo
sempre questionei o bom velhinho
e achava a cegonha um bicho feio e chato
"Coelhinho da Páscoa, o que trazes para mim?"
Nada, porque eu nunca preparei o seu ninho
nunca fui dormir com contos de fada
e nem tinha medo do monstro
que vivia embaixo da minha cama.


Acordei pra vida cedo
hoje vivo com sono
Fabiano Reis

Sede no fim

Não sei como me defender dessa ternura que cresce escondido e, de repente, salta para fora de mim, querendo atingir todo mundo. Tão inesperada quanto a vontade de ferir, e com o mesmo ímpeto, a mesma densidade. Mas é mais frustrante. Sempre encontro a quem magoar com uma palavra ou um gesto. Mas nunca alguém que eu possa acariciar os cabelos, apertar a mão ou deitar a cabeça no ombro. Sempre o mesmo círculo vicioso: da solidão nasce a ternura, da ternura frustrada a agressão, e da agressividade torna a surgir a solidão. Todos os dias o ciclo se repete, às vezes com mais rapidez, outras mais lentamente.
E eu me pergunto se viver não será essa espécie de ciranda de sentimentos que se sucedem e se sucedem e deixam sempre sede no fim.
- Caio Fernando Abreu -

31/08 - Cabe aqui um trechinho da música do Paulinho da Viola que o Gustavinho me apresentou, em meio a cervejas mil - aliás, no próprio dia 12... algo como " bom saber que a solidão é o começo de tudo"... que maluco eu só perceber o quanto ela encaixava aqui tanto tempo depois...

Thursday, August 11, 2005

On'q'o'tô ???

Eis que surge uma apresentação do Grupo Corpo na minha noite de ontem...

E meu deslumbramento é tanto que quase não me atrevo a escrever sobre...

Começou com o "Lecuona" (de onde saíram essas fotos) - lindíssimo, onde "os casais se sucedem decantando paixões, segundo roteiros que vêm tanto do romantismo mais desbragado quanto do realismo sem máscara de cada um de nós". Isso sem contar os figurinos fantásticos....


Onde pode acolher-se um fraco humano,
Onde terá segura a curta vida
Que não se arme e se indigne o céu sereno
Contra um bicho de terra tão pequeno? -
Caetano Veloso, sobre poema de Camões -

Depois, o Onqotô.
Acho que desde aquela apresentação de Butoh, com o Lopes, anos atrás, que eu ñão ficava tão "mexida" com um espetáculo...
As músicas, letras lindas, o grau de entrega dos dançarinos, todo o sentimento transbordante... tão sublime tudo que fiquei, literalmente, me perguntando "onde que eu tô?" e me sentindo "um bicho de terra tão pequeno"...

Mais mundanamente falando, como era a pré-estreia, rolou um coquetel delícia depois, com direito a vários "famosos" e "semi-famosos"- de FHC a Zeca Camargo... engraçado! Inclusive, o Marcos Frota quase despencou em cima de mim (será que ele é cego mesmo? rsrsrs - sorry pela piada infame!)
E o Caetano lá, tudo de bom...
(Enfim, depois das fotos como ícone da saia rodada no SP Fashion Week (hahaha!!) foi um dos dias mais "celebridades" dos últimos tempos...)

Gi - valeu muitíssimo!! Foi um espetáculo transformador - super obrigada... Te devo mais essa!

PS.: Anda fazendo cada vez mais sentido fazer a tauagem de Shiva...

Wednesday, August 10, 2005

Itamambuca

Coisa mais acertada foi eu ter ido no final de semana passado para Itamambuca...

















Eu adoro, adoro aquela praia, mas o que torna tudo mais especial pra mim é esse Rio. Adoro ir passando pelo mangue, ver os carangueijinhos arriscando sair da toca... não sei explicar - acho que eu, menina da cidade que sou, vivo tão afastada dessas manifestações mais corriqueiras da natureza, que ditam o ritmo da vida, que me encanta moldar meus caminhos tendo que pensar no Rio enchendo e esvaziando...

Isso sem contar o sol, caminhadas, cervejinha na areia, milhões de conversas em dia, pizza feita em casa, no forno à lenha... e, neste final de semana, até o campeonato de surf Master rolando, que, se tira um pouco da tranquilidade, sem dúvida alguma, agrada aos olhos...

E hoje está fazendo tanto frio, que eu resolvi até colocar aqui uma fotinho de lá para tentar trazer um pouquinho de calor e dar aquela alegrada...

Tuesday, August 09, 2005

Descompasso

Somente quem tem saudades entende os recados dos jardins.
Queria o jardim dos meus sonhos, aquele que existia dentro de mim como saudade.
O que eu buscava não era a estética dos espaços de fora;
era a poética dos espaços de dentro.
Eu queria fazer ressuscitar o encanto de jardins passados,
de felicidades perdidas, de alegrias já idas.
- Ruben Alves -

Passada a euforia com preparativos de aniversários e outros eventos, sobrinhas gêmeas - e lindas! - nascendo, e overdose de ciranda nos finais de semana, me pego querendo , enfim, fazer a tal faxina... sem a urgência que eu sentia antes, de querer a todo custo me livrar de tudo antes do meu aniversário, mas de uma forma serena, simples balanço dos ultimos tempos e envolvimentos...
E - fique claro! - eu não quero ressucitar nenhum relacionamento.
Quero, talvez, ressucitar em mim a disponibilidade para me encantar novamente com as pessoas...

Ao "colocar ordem na casa", me deparo com uma certa saudade e muitas, muitas "eminências de presentes/ quase declarações/ mimos comprados e nunca entregues"... Resquícios de tempos e envolvimentos diversos, que foram se acumulando aqui e ali...

Começo a pensar um pouco sobre meus "padrões de relacionamento", como meu constante pé atrás faz com que eu economize nas manifestações de afeto... Se, por um lado, me sinto menos patética do que provavelmente me sentiria se tivesse transbordado todo meu carinho, por outro fica uma certa culpa por não ter cultivado devidamente/ espontaneamente ternuras...

Todas essas coisas de que falo agora - as particularidades dos dragões, a banalidade das pessoas como eu -, só descobri depois. Aos poucos, na ausência dele, enquanto tentava compreendê-lo.
Cada vez menos para que minha compreensão fosse sedutora, e cada vez mais para que essa compreensão ajudasse a mim mesmo a. Não sei dizer. Quando penso desse jeito,enumero proposições como: a ser uma pessoa menos banal, a ser mais forte, mais seguro, mais sereno, mais feliz, a navegar com um mínimo de dor. Essas coisas todas que decidimos fazer ou nos tornar quando algo que supúnhamos grande acaba, e não há nada a ser feito a não ser continuar vivendo.


Então, que seja doce.
Repito todas as manhãs, ao abrir as janelas para deixar entrar
o sol ou o cinza dos dias, bem assim: que seja doce.

- Caio Fernando Abreu -

Cada um vai sendo moldado pelas suas experiências e cicatrizes e, tenho que admitir que eu entro nos relacionamentos já na expectativa do final... começo a ficar tão ansiosa na eminência do fim, que quando ele acontece é quase um alívio – meio na linha da "profecia auto-realizadora". E é impressionante o quanto eu me deixo "afundar" nesta angústia da espera pelo fim...
E o padrão é sempre o mesmo: as coisas começam e eu muito reticente para me envolver, tateando, pisando em ovos... então eu começo a ensaiar baixar um pouco a guarda, dependendo dos rumos e afetos... quando eu finalmente crio coragem e baixo a guarda, quase disposta a viver algo maior que eu... pimba!! Vem o pé na bunda... (Em tempo: existe também um outro padrão: os relacionamentos "back stage", anos a fio, em paralelo, pano de fundo da minha vida sempre... mas essa é outra estória, fica para outro devaneio...)


Bom, se este é o padrão pra que me angustiar?

Eu não tenho a mínima intenção/pretensão de mudar minhas atitudes para que os relacionamentos se prolonguem - acredito muito que o que demanda muito esforço deve estar no caminho errado, então melhor que não vá mesmo muito adiante. E também acredito que a gente não pode sair mudando as atitudes para agradar os outros - fazer isso é eliminar o principal "filtro" que te protege de se envolver com pessoas que não tem tanto assim a ver com você...
Mas, se acabar logo mesmo quase que independente de minhas ações...

Então eu, "Rainha do descompasso", só quero mesmo tentar entender, definir qual a melhor forma de aproveitar esse intervalinho entre o início ( quase sempre inesperado) e o fim (ironicamente, super esperado!).

Apesar desse descompasso ter sempre imperado nos meus encontros e desencontros, textos e músicas tem um poder incrível de me encontrar nas horas mais certeiras... Foi assim que, do nada, me apareceu este trechinho da Clarice, como uma espécie de "redenção" dos meus mini relacionamentos todos,

Gosto do modo carinhoso do inacabado, daquilo que
desajeitadamente tenta um pequeno vôo e cai sem graça no chão.

Clarice Linspector


Então, como que por encanto - um, dois, três, como diria meu pai, em seu jeito peculiar de lidar com as coisas - eis que esse trechinho tão singelo lava qualquer restinho de mágoa e sensação de fracasso e deixa no lugar uma ternura gostosa... e até uma vontadezinha de incentivar novas tentativas de pequenos vôos, mesmo que fadados a cair no chão...
Voltando a Caio Fernando de Abreu...

"Agora apenas deslizo, sem excessivas aflições de ser feliz. (...)
Que seja doce. "

Monday, August 08, 2005

insurgência de alegria e irreverência!!


Como se não bastasse o Show em homenagem ao Candeia ( Thereza Cristina, Paulinho da Viola e Quinteto em Branco e Preto) a balada rolou noite adentro na FITareta - na descrição do próprio Gustavinho "Evolução do carnaval fora-de-época. Revolução no cenário festivo da Cidade Universitária."

Cheguei por lá quase meia-noite - o povo já embalado, uma alegria só...

Foi uma noite de muita música, dança, reencontros com pessoas queridas e sumidas, enfim..

Sem grandes milongas: eu tenho um orgulho gigantesco desses meus amigos lunáticos e, ao mesmo tempo, tão determinados em tornar este mundo um lugar mais interessante!!



Pra completar, fica aqui a versão biológica da minha marchinha mais querida, para cantar ao ritmo de "se você fosse sincera, ôôôô, Aurora"

Se você fosse Scheflera
(ô ô ô ô) arbórea
subiria até a copa
(ô ô ô ô) pra coletar-te
Mas você é arbustiva
(ô ô ô ô), sem chance
Da família Araliaceae (ô ô ô ô), Scheflera

Um lindo arbustinho do Brasil interior
Que coisa mais bonita quando ele entra em flor
Scheflera arbustiva epíteto vinosa
(ô ô ô ô) - Scheflera!

E cada vez mais eu acredito que a alegria é uma das formas mais sublimes de subversão!!!

Gustavinho, meninos do Sambozo, Lincoln e "FITeiros" todos - a vocês, toda minha admiração!

Friday, August 05, 2005

que filme é você??

Num desses descaminhos internéticos esbarrei neste teste...Adorei o resultado !!
Amelie é, muito, muito, um dos meus filmes preferidos!!
Fiz o teste uma segunda vez, mudando algumas respostas que eu fiquei meio em dúvida e deu "O sétimo Selo" de Ingmar Bergman...
Tudo bem que a jogar xadrez com a morte é uma cena imbatível, mas... definitivamente prefiro as escolhas que me levam a caminhos mais leves e coloridos...
Ainda mais nesses últimos tempos, que eu ando me dando tantos "pequenos prazeres " à la Amelie...
Enfim - quem tiver curiosidade, entra lá no site e vê no que dá...

Você é "O Fabuloso Destino de Amelie Poulain" de Jean Pierre Jeunet.
Você é engraçado(a), original. Uma pessoa leve e maravilhosa de se conviver.

Faça você também Que bom filme é você?
Uma criação deO Mundo Insano da Abyssinia


"Alguma coisa está fora da ordem..."

Tantas coisas tem surgido meio anacrônicas - textos que encaixariam em outros momentos, fotos reveladas com muito atraso, águas passadas tentando mover moinhos - ou, pelo contrário - coisas perdendo a importância... ( A Linha do Tempo. por exemplo, apesar de ainda ser muito "eu ", se escrita hoje seria bem diferente...) que eu fico em dúvida... : não sei se mantenho os escritos aqui como estão - fiéis retratos de um momento "x" ou se, conforme meus sentimentos/ impressões, ressonâncias vão mudando eu posso também ir mudando/acrescentando ao que já está aqui...
Hoje mesmo, sapeando no blog da Gi, estava lá, finalmente, a "Teoria do Surto"- que a gente já tinha conversado deveras e que eu comentava em um post lá atrás (obviamente, em meio a um surto/ catarse/resposta!). Esse até que não foi difícil - fui lá e inclui o link. Mas fiquei pensando se, no fundo, isso não é um pouco uma forma de "fraudar" meu próprio passado...
Eu acho é que a gente vive mesmo é criando versões do que passou, do que viveu... iluminando o que gosta mais, enfatizando o quanto sofreu, amenizando o quanto fez sofrer, querendo acreditar que é o "mocinho da estória", que "C’est pas ma faute"...
Só que cada um vai fazendo isso para um lado e no fim, fica até dificil resgatar fatos em si... Outro dias estava ouvindo uma amiga contando umas estórias passadas... e as conclusões dela neste momento sobre algo que aconteceu tempos atrás eram tão diferentes das conclusões de tempos atrás e do que eu mesmo lembrava da estória... e não se tratava de uma questão de amadurecimento, ponto de vista mais amplo... a diferença estava nos recortes mesmo, na "edição" com direito a efeitos especiais ... E eu não tenho dúvida de que ela estava sendo auper fiel à ela mesma, no contar!
O fato é que o que permaneceu da estória pra ela era extremamente diferente do que tinha permanecido pra mim - aliás, a "leitura" era tão diferente que quase parecia uma outra estória!!

Fiquei pensando então nas minhas estórias... será que elas ficaram em mim de uma forma absurdamente distorcida, diferente do que foi? Por outro lado, se for assim ( e eu acho que é) isso é mesmo um problema?
Não é o eco na alma mais importante que o fato?

Ainda não é uma decisão definitiva - graças aos céus, eu não faço a menor questão de tomar decisões definitivas! - mas vou tentar manter as versões "originais" dos escritos por aqui - sei lá, um pouco como fosséis ... Entretanto, não pretendo ter nenhum pudor em agregar outras leituras, outros olhares ao que já passou... mas quero pensar em um jeito de deixar registrado, de alguma forma, as várias versões que eu for criando da minha estória... assim olhar para trás vai acabar sendo um pouco uma "arqueologia de mim" ...

Bom, deixa eu ir que tem show da Thereza Cristina e do Paulinho da Viola me esperando...
E Itamambuca amanhã - porque anda fazendo uns dias lindos...

Tuesday, August 02, 2005

Quebra cabeça

... sabe quando você está começando a montar um quebra-cabeça?
Às vezes, você não começa a agrupar algumas peças, crente que elas vão formar, sei lá, a superfície de um lago, e, depois de sofrer horrores, tentando loucamente dar um jeito de encaixar, amaldiçoando o destino por vir sempre com umas peças faltando, percebe que na verdade elas se encaixam de outro jeito e formam um pedaço de céu?
Então... as vezes, o que parece ser errado, no lugar errado, na hora errada, pode fazer o maior sentido quando visto mais de longe...
Não necessariamente o sentido que gostaríamos que fizesse, mas...

(... e, se for céu mesmo, ao invés de lago,
a gente vai precisar de asas e não de remos... )


- Luiz - esse brotou prá você, mas não resisti colocar aqui também..-

Julho Fantástico!!! - Melhores Momentos

Considerando que o mês do aniversário costuma ser um mês de "inferno astral", não posso, de forma alguma, reclamar deste Julho fantástico que passou...

Estão aqui as fotos que não me deixam mentir!! (Valeu , Paulinho, você é um anjo!)
Afinal, foram:

- Muitos eventos delícia: Festa Julina na represa, Parabéns no Tocador de Bolachas do próprio dia 20 e gnocchi da fortuna no 29... isso sem contar a pseudo quadrilha e os momentos no balanço...

- Muita musica e cultura popular: Bumba no Sesc, A Barca no Cachuera,
Axial no Buttina, Cirandeiros no Cachueira e no Ceu Butantã, Jongo e Pau de Brauna no Casarão do Cunha... Até marchinhas na Bio!!! Fora as aulas de canto e dança Afro, que são um espetáculo a parte...
Muitos amigos - aqueles sempre presentes (cartão GOld-Master-Super no programa de Milhagem, não é, Tank!?!) , outros "ressucitados", outros super guerreiros, que não me abandonam nunca, apesar das minhas mancadas, os companheiros de balada, de PI´s e de cirandas... do trabalho, da Bio, da oitava série, do colegial, dos caminhos e descaminhos todos...


- Muitos shows, alguns teatros: Monica Salmaso, Roberta Sá, Axial, Cirandeiros de Parati...Algumas peças de Teatro: "Ópera do Malandro" e "Uma Praiazinha de Areia Bem Clara, Ali, na Beira da Sanga", de Caio Fernando Abreu (autor fantástico, mas... a maior roubada, Ana, eu sei, mas vou me redimir...)



Muitos lugarzinhos especiais:
O Tocador de Bolachas, o BarBolla (merecidamente eleito "o melhor bar para ir a dois" - e olha que eu sou mestre em lugares fofos!), o Garimpo lá no Embu...
Muitos finais de tarde ( e madrugadas!!) regados a chopp: Filial, Municipal, Genésio, Original, Posto 6, All Black, Lanterna, VIlaboim, Segundas Intenções, Jardim Elétrico, CA da Biologia ... uma farra atrás da outra!!!

Finais de semana mágicos: Festa Literária em Parati ( e re-apropriar-me de Parati já foi uma festa!!); Aventuras entre panos e bordados, Final de semana encantado no Embu...

Além de uma "estripulia" aqui, outra ali... afinal, se "a gente tá engolindo cada sapo no caminho, a gente vai se amando que, também, sem um carinho, ninguém segura esse rojão"...



Pessoas que estão em volta - valeu super!!
Sem vocês eu não dava conta não!!

--> Fê - amei sua "aparição" na festa Julina!! Outubro que nos aguarde!!